Deixar o lar é um processo delicado para qualquer família. Mesmo em situações como riscos de desabamento, por exemplo, a saída de casa implica em afastar-se dos vizinhos, amigos e parentes, deixar o local onde se conhece a dinâmica do transporte público e do comércio local. Acolher famílias nessas condições é a tarefa dos profissionais que atuam no Abrigo Granja de Freitas, unidade pública de acolhimento institucional que há mais de 15 anos integra o Sistema Único de Assistência Social de Belo Horizonte (Suas-BH). Mais de 70 famílias acolhidas contam com o profissionalismo e o envolvimento de uma equipe sensível e engajada. Entre os principais objetivos do atendimento estão a garantia da proteção aos usuários, o estímulo à autonomia, e a promoção do acesso à qualificação profissional e a inclusão produtiva.
No início de janeiro, o trabalho no abrigo precisou ser redobrado em função das chuvas que deixaram muitas famílias desabrigadas na capital. Tudo previsto pelas equipes da Prefeitura, em especial pela equipe da gerente Helizabeth Itaborahy. Acostumados com os períodos chuvoso e seco, de outubro a março, eles se preparam para um momento de chegada de novos moradores, quando precisam administrar conflitos e prestar atendimento socioassistencial a muitos ‘novatos’ ao mesmo tempo, junto com a população de outros períodos. De março a setembro, tentam colocar a casa em ordem, facilitar o processo de saída das famílias que ainda precisam estruturar-se para voltar pra casa, ou conseguir um novo endereço, digno e seguro.
De acordo com Helizabeth Itaborahy, o abrigo contribui para a prevenção de situações de negligência, violência e ruptura de vínculos familiares e comunitários, além de promover acesso à rede socioassistencial, aos benefícios e às demais políticas setoriais como Saúde e Educação, assim como informar ao cidadão sobre seus direitos e como acessá-los. São estimuladas as participações em atividades socioeducativas, com a contribuição para a melhoria da autoestima e da autonomia. Além disso, é estimulada a participação em ações de cuidado e tratamento contra abuso de álcool e outras drogas.
Há oito anos no abrigo, a assistente social Kátia Parreiras diz que já viu famílias se instalarem no Granja por apenas 15 dias e outras permanecerem por até quatro anos. Ela explica que apesar do caráter temporário do acolhimento, construir a saída do abrigo passa por questões e dificuldades muito pessoais. “Muitas vezes temos que ajudá-los a elaborar suas próprias demandas”, disse. Hoje o abrigo tem 73 famílias e são 346 pessoas vivendo em um mesmo espaço. Com as últimas chuvas, chegaram 59 famílias e ainda restam 29 unidades desocupadas. Nesse contexto, cada técnico se dedica a atender 18 casos distintos.
O psicólogo Leonardo Félix Teixeira disse que é preciso criar estratégias de contato com os usuários que chegam. “Eles vêm com arranjos de vida muito variados. As pessoas têm modos diferentes de pensar, sentir e agir que impactam em nosso trabalho”. Segundo Leonardo, o Granja de Freitas recebe públicos distintos, são famílias com muitas crianças, jovens, idosos, pessoas com deficiência e muitos têm comprometimento com o álcool e outras drogas. Um desafio para a equipe que busca sempre se capacitar para atender a essas diversidades.
Mediação
A monitora Vanda Rodrigues da Rocha conhece de perto a vida das famílias acolhidas. Com uma escala diferenciada de trabalho, ela também convive com os moradores durante o turno da noite e garante que, durante a convivência, aprende muito com a troca de experiências. Vanda e os outros monitores propõem atividades de cultura, esporte, convivência e fortalecimento de vínculos, além de mediarem questões intra ou interfamiliares. A mediação também faz parte do cotidiano da gerente do espaço, que coordena 18 profissionais, participa de instâncias interinstitucionais e estimula a intersetorialidade entre serviços de diferentes políticas públicas.
Recém chegada ao abrigo, Maria dos Anjos Costa, de 54 anos, mora com familiares. São filhos, netos e irmãos que tiveram que deixar a casa em Venda Nova por risco geológico. A família, como a grande maioria dos usuários acolhidos, tem benefício da Bolsa Moradia liberado, mas procura um imóvel adequado para alugar. Para Maria dos Anjos, o acolhimento facilitou o acesso a outros serviços públicos. “Fui encaminhada para o médico e tirei documentos. Aqui recebo atenção e me sinto protegida. Parece que tem dez anos que conheço o pessoal do abrigo”, relatou.
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